"Contribuir com o fortalecimento das Organizações Sociais na perspectiva da defesa dos direitos e da transformação social, construindo parcerias e dando visibilidade a práticas sociais inovadoras".

Juventude discute protagonismo e direito à Cidade

Encontro virtual reuniu a potência da juventude periférica de três regiões do Brasil que partilharam  desafios e alimentam a esperança

 

 

Instituições parceiras de Miserior que atuam com adolescentes e juventude, reuniram jovens do norte, nordeste e sudeste do país para trocar experiências sobre direitos e justiça social. O encontro foi realizado (12/07) em formato virtual e debateu o tema, “Juventude: Protagonista e o Direito à Cidade”. O encontro integra o processo de articulação para a troca de metodologias, aprendizados e estratégias de lutas para fazer avançar os direitos. O momento de partilha foi organizado pelos jovens do Movimento República de Emaús (CEDECA- EMAÚS) de Belém (PA), Centro de Defesa à Vida Herbert Souza (CDVHS), Jovens Agentes de Paz (JAP), ambos da cidade de Fortaleza (CE) e, Se esta Rua Fosse Minha (SER) da Baixada Fluminense (RJ). O evento também teve o apoio do Centro de Defesa dos Direitos Humanos Dom Helder Câmara (CENDHEC) e Centro de Assessoria e Apoio a Iniciativas Sociais (CAIS)

 

O momento foi oportuno para os jovens periféricos abordarem realidades e desafios, a exemplo dos pontos em comum relacionados aos direitos sociais básicos. Falaram sobre as violências sofridas no cotidiano, preconceito, racismo, medo e pontuaram a ausência de espaços públicos para o lazer, além da discriminação que sofrem nas cidades que vivem.

 

Vários rostos atentos às partilhas. O encontro começou apresentando a diversidade cultural de cada estado para afirmar a identidade regional, protagonismo e riqueza dos jovens da periferia das cidades que fazem parte do maior grupo social do Brasil. Durante o encontro se constatou mais uma vez a dificuldade ao acesso de internet com qualidade nas periferias. Desafiando a instabilidade da internet adolescente e jovens dividiram algumas janelinhas da sala virtual e ouviram músicas, vídeos e depoimentos de outras experiências.

O encontro reuniu a potência da juventude periférica das três regiões que tem como ferramenta a arte, a cultura e as escolas para difundirem as temáticas sobre o acesso aos direitos, sobretudo o direito à cidade. Os espaços das escolas e até mesmo ambientes ao céu aberto como a realidade dos jovens da cidade de Belém são espaços para fortalecer as articulações na busca de um futuro melhor para as comunidades.

 

 

Arte do card produzido para o encontro.

 

Juventude de Belém do Pará buscam por espaço de lazer e acesso à educação

Os jovens de Belém abriram o encontro partilhando a beleza cultural da cidade que vai além do que geralmente é apresentado, a diversidade cultural do estado do Pará é relacionada também às ancestralidades dos povos. Os jovens falaram das dificuldades que os seus bairros periféricos sofrem com a insegurança, falta de espaço para o lazer e as precariedades das escolas públicas que apresentam problemas que fogem da infraestrutura física e impedem o acesso à cultura e a participação nas aulas com regularidade. “Em relação às escolas, eles dizem que não há verbas e no final quem acaba sendo prejudicado somos nós, alunos que dependemos da escola pública”. Partilhou o jovem Richarlyson da Cedeca de Emaús de Belém (PA).

 

“Eles dizem que não há verbas e no final quem acaba sendo prejudicado somos nós”

 

Além das dificuldades de acesso à escola, os jovens de Belém falaram que a assistência à saúde também é um problema grave enfrentado pela maioria das comunidades periféricas. O medo de serem vítimas de “bala perdida” e o medo da própria polícia, obriga jovens e adolescentes a recriarem suas atividades e reinventarem movimentos para visibilizar suas expressões sobre a cidade. Os jovens apresentaram a realidade da comunidade periférica de Tapanã, que conta com o projeto apoiado pelo Centro de Defesa que contribui com a visibilidade de jovens e adolescentes. O projeto foi criado por um grupo de mães que tiveram seus filhos assassinados e desde a criação em 2014, mobiliza ações junto aos jovens e a comunidade. A dificuldade maior dos jovens da comunidade de Tapanã é o lazer e o acesso à escola. Atualmente só existe um terreno que serve como espaço para os jovens se reunirem e com limitações.

“A troca de experiências no encontro com os adolescentes, demonstrou que apesar das diferentes regiões do Brasil, as lutas pelo acesso aos direitos são semelhantes, pois a desigualdade é igual nas periferias de todo o país. É importantíssimo fortalecer e incentivar o protagonismo dos adolescentes”. Disse Sérgia Travassos do Cedeca Emaús, de Belém (PA).

 

A porta de saída é a cultura!

Os jovens de Fortaleza (CE), começaram as apresentações fazendo a audiodescrição, linguagem inclusiva que permite às pessoas com deficiência visual acessem informações sobre a realidade do momento ou lugar que estão presentes. Eles partilharam a experiência da articulação que envolve cinco bairros periféricos com projetos culturais nas escolas públicas de ensino médio. O objetivo das ações é estimular os jovens a participarem das temáticas que envolvem a realidade da juventude sobre os acessos aos direitos e as políticas públicas.

“Nós moramos em uma região litorânea, mas muitos de nós jovens, infelizmente não temos acesso à praia. O nosso território tem arte, cultura, direito e diversidade e acreditamos que a nossa cultura e a nossa arte podem resgatar a nossa identidade. Na periferia não existe só crime. Favela quer viver! A importância de um espaço de fala enquanto pessoa periférica, nos deixa felizes, é reconhecer o nosso território”. Afirmou Gisnaína Braz, que integra o coletivo Jovens Agentes de Paz e articula o Festival da Juventude. Gil, como é conhecida tem 17 anos, se declara “cis LGBTQIA+” e descobriu a arte da poesia no espaço do coletivo de jovens.

 

“O nosso território tem arte, cultura, direito e diversidade”

 

O Festival da Juventude tem fortalecido os jovens das comunidades periféricas de Fortaleza, com o apoio das escolas, as interações acontecem com frequência, além da realização do festival que acontece durante quatro dias no período integral das escolas. Os jovens partilham dados do último festival, realizado em 2022 que teve mais de 60 parcerias e 23 representantes de coletivos de juvenis. Os jovens apresentaram a porcentagem do público que participou, 56 % de mulheres cisgênero, 32 % de homens cisgênero, 4,4 % mulheres trans, 1,6 % homens trans e 1,5 % de pessoas não binárias.

Os jovens de fortaleza relataram a discriminação como um dos enfrentamentos diários que reflete até mesmo pelos serviços de aplicativos, que negam prestação de serviços quando se trata de bairros de periferias. Com a articulação reforçada nas comunidades, os jovens de Fortaleza têm colocado que a periferia também possui e pode oferecer espaços para evidenciar a cultura. A violência também é uma realidade, mas a defesa da vida é permanente com a periferia sempre viva como eles expressaram em vários momentos de suas falas.

“Como assessora de juventude foi muito animador participar do encontro. Uma experiência muito singular de como é potente reunir juventudes de diferentes cidades para compartilhar experiências de vida e criatividade na luta pelos direitos. Acredito que esse intercâmbio ficará na memória dos jovens participantes que puderam superar as barreiras da distância geográfica e conseguiram estabelecer conexões através da arte”. Manifestou Ingrid Rabelo do Centro de Defesa à Vida Herbert Souza (CDVHS) da cidade de   Fortaleza (CE).

 

A arte dos jovens da Baixada Fluminense ilumina caminhos nas escolas da periferia

A juventude da Baixada Fluminense (RJ) apresentou o movimento de articulação que é bastante envolvente e inspirador. Eles reúnem arte e cultura em formato de espetáculo apresentado nas escolas. Uma proposta semelhante à dos jovens de Fortaleza. O espetáculo aborda o cotidiano da favela que aborda inclusive a falta de acesso a espaços culturais públicos nas comunidades, acesso à educação, direitos e protagonismo dos jovens na cidade. O espetáculo já percorreu 10 municípios da baixada e as apresentações foram realizadas nos Centros Integrados de Educação Pública (Cieps). A produção do espetáculo é realizada pelos próprios jovens do projeto “Se esta Rua Fosse Minha” (SER). Além da produção, a cada apresentação eles realizam oficinas com os alunos das escolas participantes.

 

“Percebemos que a cultura demora para chegar neles ou de fato a cultura não chega”

 

“Percebemos a cada apresentação as dificuldades de cada região e os alunos ficavam maravilhados, a sensação para eles, era como se estivessem assistindo um show de Hollywood, algo assim. Percebemos que a cultura demora para chegar neles ou de fato a cultura não chega para eles e quando chega é pela metade”. Relatou Bruna da Vitória Ribeiro, que apresentou a iniciativa no encontro.

 

“A troca de saberes protagonizada por juventudes tão diversas e potentes, oportunizada pelo encontro promovido pelo CAIS, foi um momento privilegiado também para impulsionar novas ideias por cidades mais inclusivas. Nós, do Se Essa Rua, somos convictos da força criativa das juventudes, por isso apoiamos e encorajamos suas iniciativas. Aguardamos com entusiasmo por novos momentos de diálogo e construção”. Expressou o coordenador do (SER)

 

Para Kohara, assessor metodológico para a temática urbana do CAIS, o encontro demonstrou a realidade da juventude periférica brasileira que é rica em inteligência, arte, sonhos e que resiste para não serem massacrados. “São vocês que vão transformar esse Brasil com essa realidade que mostra que a periferia é rica de tudo, primeira rica de humanidade, inteligência, de arte e beleza. Indica que tudo pode ser melhor”. Expressou Kohara para os jovens.

O encontro foi bastante positivo para o processo de formação através das trocas de experiências e aprendizados. O próximo passo é realizar mais um encontro no mês de setembro, ainda sem data prevista com a participação da juventude rural. Um dos encaminhamentos  é a partir destes encontros, articular a participação de alguma representação do governo federal para ouvir os jovens a debater mais sobre as políticas para a nossa juventude.

Paulo Maldos, secretário executivo do CAIS, considera o encontro fortalecedor e que permite uma interação própria e capaz de produzir novos caminhos para o país. “A interação entre jovens vai na direção de produzir uma cultura nova em nosso país, é uma nova cultura que permite a possibilidade e o protagonismo da juventude”. Disse Paulo Maldos.

 

 Por Cláudia Pereira | Comunicação do CAIS