"Contribuir com o fortalecimento das Organizações Sociais na perspectiva da defesa dos direitos e da transformação social, construindo parcerias e dando visibilidade a práticas sociais inovadoras".

Homenagens a Dom Pedro Casaldáliga marcam a despedida do grande defensor dos direitos humanos

Comunidades Eclesiais de Base, Pastorais, Movimentos, Centros e Institutos publicam Carta em homenagem a dom Pedro

“Hoje, a Igreja do Brasil e da América Latina se despedem de um grande Profeta. Dom Pedro Casaldáliga faz a sua Páscoa junto a Deus, e nos deixa uma vida e missão de dedicação ao povo, especialmente aos mais pobres e marginalizados/as, aos povos indígenas, pelos direitos humanos. Seu testemunho foi sempre pautando a libertação daqueles e daquelas que são oprimidos/as,assumindo em seu projeto de vida e missão a missão de Jesus: ‘pois ele me ungiu para anunciar a boa notícia aos pobres: enviou-me para proclamar a libertação aos presos e,aos cegos,a recuperação da vista; para dar liberdade aos oprimidos e proclamar um ano de graça do Senhor'(Lc 4,18-19)”. Diz a abertura da carta assinada por diversas pastorais, movimentos e comunidades eclesiais de base, que ao longo de décadas beberam da fonte missionária, pastoral e humanitária de dom Pedro Casaldáliga.

Leia a carta na íntegra aqui

Entre as muitas homenagens está também o texto do pastor luterano Roberto E. Zwetsch.

Monsenhor Casaldáliga – Pedro Liberdade

Dom Pedro, pastor, poeta, profeta,
Pedro irmão, amigo, defensor
De gente humilde, esquecida,
Como abandonado era o sertão onde ele foi morar
Viver, evangelizar.
E então ser bispo, articulador, semente de resistência.
São Félix do Araguaia nunca mais foi a mesma
Depois que ele chegou!
A carta de uma Igreja na Amazônia em conflito com o latifúndio
E a marginalização (1971)
Inaugurou um grito, instituiu o que mais tarde
Passaria a se chamar “uma igreja com rosto amazônico”.
Mas foi como uma senha,
Causou furor nos inimigos da gente pequena,
Espantou os governantes, fruto de um golpe militar e
Civil, apoiado pela elite de sempre.
O golpe outro, aquele que durou 21 anos,
Que hoje se repete no novo golpe deste século 21
E já nasce torto, obscuro, violento,
Dominado pelo conluio de forças
Midiáticas, parlamentares, judiciais,
Que agem amparadas na lei higienicamente burlada,
Forçada, quebrada ao sabor dos interesses.
Mas não menos covarde como outrora.
Pedro entre nós resiste, chora, ora, preservando
A mesma verve, embora o corpo sofra e grite.
A lucidez o mantém vivo, alerta, solidário sempre
Com a Amazônia, os povos da floresta,
O papa Francisco, o último Sínodo,
Aquele da ecologia integral
Que uniu num só espírito
A luta da terra e a luta dos pobres.
Pedro sonhou com este conclave maior fazia muito
E o viveu na solidão do sertão do Mato Grosso
Cercado pelo carinho do seu povo e da comunidade.
Teria estado lá com seus irmãos e irmãs
Não fosse a debilidade vivida no limite,
Na fé e na ousadia teimosa de quem aprendeu
– a duras penas – a dizer: Não!
À injustiça, à desigualdade, à violência, ao crime hediondo,
Diante da desfaçatez, ele foi sempre enfático: Não!
E pagou um alto preço pela ousadia.
Em seu lugar, pregou a união dos diferentes,
A comunhão dos pequenos, a partilha do pouco,
A vivência da fé na coragem de ser,
A alegria da festa comunitária, a criançada
A correr feliz na beira do grande rio
Que ele conheceu como poucos em suas muitas
Travessias, atento às margens, aos pássaros,
Às tartarugas e aos peixes voadores.
Nunca se furtou à conversa com os canoeiros,
Os peões de fazenda, as moças das vilas,
Os jovens das escolas,
As avós famintas, os lavradores sem terra
Que produziam feijão, macaxeira, banana,
As frutas do quintal.
Essa gente amiga que sempre o abrigou
Nas casas de palha, de barro batido,
Onde havia rede e um café passado na hora.
Por isso mesmo, casa fraterna e mesa repartida.
Pedro teve por báculo o remo tapirapé,
Como anel, o tucum dos povos indígenas,
Por mitra, o chapéu de palha
E por calçado a sandália de borracha.
Escândalo episcopal, profecia encarnada no corpo,
Na mente e no espírito inquieto da
Insurreição do evangelho.
Viveu a colegialidade do ministério com
O clero, as religiosas e o povo das comunidades
Sempre à escuta da sabedoria popular.
Hoje vive sua própria páscoa, travessia,
Na entrega do corpo, da vida, da inteligência,
Da fé, dos sonhos que sonhou
de olhos abertos e espírito apaixonado.
Uma entrega que se mostra símbolo de utopia
E do compromisso maior
Na senda aberta pelo Senhor dos Passos,
O Cristo Jesus de Nazaré e de todos os povos.
Em comunhão com Pedro, seguiremos seu caminho
Na unidade do Espírito da Liberdade.
O Deus de toda paz o cubra de bênção, de amor
De misericórdia e de compaixão.
A alegria do evangelho vencerá,
Ah, vencerá mesmo, Pedro,
Ainda que a maldade pareça infinita.
Vem, Senhor Jesus!
No fim, permanecem a fé, a esperança e o amor.
Mas o maior é e sempre será o Amor!